Câmara do Rio impõe primeira derrota à ‘milícia’ de Paes e reafirma sua autonomia legislativa

Vereadores da Câmara Municipal do Rio aprovaram proposta própria sobre segurança e rejeitaram tentativas do prefeito Eduardo Paes de criar força armada com contratados temporários.

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Palácio Pedro Ernesto - Foto: Cleomir Tavares/Diário do Rio

Os leitores de meus artigos sabem muito bem que sempre critico a submissão dos vereadores da Câmara Municipal do Rio de Janeiro (CMRJ) aos interesses do senhor Prefeito em algumas votações, bem como o fato de permitirem, ao abrirem mão de sua competência privativa, que o Prefeito crie e extinga, segundo seus interesses pessoais e eleitorais — ao arrepio da Constituição — secretarias e órgãos municipais por decreto, e não por lei.

Mas, sem entrar no mérito da questão de se devia ou não armar a Guarda Municipal, parabenizo os vereadores, pois demonstraram, no dia 15 de abril, sua não submissão a todos os interesses pessoais e eleitorais do Prefeito.

Eles aprovaram, em segunda e última discussão, um Projeto de Emenda à Lei Orgânica (PELOM) de 2018 sobre o assunto, de autoria dos próprios vereadores, e obrigaram o Prefeito a arquivar seus dois PELOMs sobre a matéria — ambos deste ano — que seriam o primeiro o para criar uma espécie de “milícia” pessoal com funcionários não concursados: a tal Força de Segurança Armada (FSA).

Veja nos sítios abaixo:

O PELOM dos vereadores aprovado no dia 15 de abril, que será promulgado pela Mesa Diretora da CMRJ (não está sujeito à sanção/veto do Prefeito):

https://drive.google.com/file/d/1ZuUpkkU4blmlyaWiAAHugv3WcxpS0AZw/view?usp=drivesdk

O 1° PELOM sobre a FSM do Prefeito, que foi arquivado:

https://drive.google.com/file/d/1bDSPreIHy7khSls8GpSnlAxnkOurQLVX/view?usp=drivesdk

O 2° PELOM sobre a FSM e a FSA a do Prefeito, que também foi arquivado:

https://drive.google.com/file/d/1iRUay7_I29qS_eiBGsz_fnL_RMN-oGlf/view?usp=drivesdk

Lembro que usei a palavra “milícia” para definir a FSM antes mesmo da existência dos dois PELOMs do Prefeito. Tratei do assunto no artigo abaixo, publicado no dia 4 de janeiro:

“A ‘Milícia Municipal’ de Eduardo Paes e o Risco de Inconstitucionalidade”

A expressão “Força de Segurança Municipal” ou “Força de Segurança Armada”, essa tal milícia não concursada do Paes, que constava dos dois PELOMs de sua autoria, foi para a lata de lixo — pois não integra o texto do PELOM aprovado.

O interessante foi saber que o Prefeito sempre tentou impedir a aprovação do PELOM de 2018. Só que, como um aprendiz de feiticeiro, neste ano, ele tentou forçar os vereadores a aprovarem sua milícia pessoal e acabou possibilitando que o PELOM de 2018 — que tanto combateu — fosse finalmente aprovado, sem tratar da tal Força de Segurança Municipal ou Força de Segurança Armada.

Ou seja, sem trocadilho, o “tiro” do Prefeito saiu pela culatra. Ele deu um “tiro no pé”.

Mas a luta continua, pois ainda está em tramitação o Projeto de Lei Complementar (PLC), de autoria do Prefeito, que cria, na Guarda Municipal, que aria a ser denominada como Força de Segurança Municipal, uma Força de Segurança Armada com funcionários não concursados (contratados temporariamente por até seis anos) — embora os tribunais superiores entendam que funcionário público da área de segurança, principalmente quando armado, tem que ser concursado, e não contratado.

Pretendo escrever um artigo tratando especificamente das decisões judiciais sobre o tema.

Veja esse PLC no link abaixo:

https://drive.google.com/file/d/1BliqmYiEmSqBSkqGb0_YORmh_nYsnFcF/view?usp=drivesdk

Infelizmente, como sabemos, o senhor Prefeito tem demonstrado ao longo dos anos que não gosta de servidor concursado.

Destaco que o servidor concursado representa uma conquista do Estado democrático, pois ingressa no serviço público por mérito, e não por indicação política ou interesses pessoais. Sua estabilidade garante independência no exercício das funções, permitindo que atue com imparcialidade, sem se submeter a pressões ou favores. Ao contrário do contratado, que muitas vezes depende da vontade de superiores ou de mandatos temporários, o concursado tem autonomia para cumprir a lei e servir à população com ética e responsabilidade.

Esperamos que os senhores vereadores, quando da votação do PLC em tela, também joguem na lata do lixo a possibilidade de contratação sem concurso para atuar na Guarda Municipal armada.

Enterrando, assim, de vez, o sonho do senhor Prefeito de ter uma espécie de milícia armada com componentes não concursados — inclusive num ano eleitoral.

Vamos aguardar os próximos capítulos dessa importante discussão na CMRJ.

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7 COMENTÁRIOS

  1. Boa noite, Antônio Sá e leitores.
    Ótima reportagem, conhecimento de causa e senso crítico democrático.
    Apenas pra constar, o Governo Municipal não tem o menor projeto que seja, sobre Municipalização de Segurança Pública. Não há nenhum estudo sobre o impacto ou como será, tal implementação da Guarda armada.

    • Prezado Nilo, que bom saber que o artigo foi de seu agrado.

      Parabéns. Perfeito seu comentário complementar. A ausência de projeto sobre a segurança publica municipal só demonstra que o interesse do senhor Prefeito não é com a população e sim com sua campanha a governador no ano que vem, pois segurança publica é uma preocupação popular segundo as pesquisas.

      Vou usar esse seu pertinente alerta num próximo artigo sobre o assunto.

      Um abraço. Antônio Sá

  2. Ao autor do artigo, Sr. Antônio, salvo engano, teve uma decisão recente do STF acerca de Lei Municipal que também alterou o nome da Guarda Municipal para Polícia Municipal, em que decidido inconstitucional a norma nessa parte. Então, seguindo essa linha entendo que de modo algum poderá o município alterar o nome de guarda para colocar qualquer outro.

    • Prezado Daniel, perfeito. Bem lembrado. Parabéns.

      A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), de 13 de abril, que trata da proibição da mudança de nome da Guarda Municipal para “Polícia Municipal” é a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 1214, relatada pelo ministro Flávio Dino.

      A ADPF 1214 foi ajuizada pela Federação Nacional de Sindicatos de Guardas Municipais (Fenaguardas) com o objetivo de suspender a liminar concedida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que impedia a Prefeitura de São Paulo de alterar o nome da Guarda Civil Metropolitana para “Polícia Municipal”. A mudança havia sido aprovada por meio da Emenda nº 44 à Lei Orgânica do Município de São Paulo. ? ?

      O ministro Flávio Dino indeferiu o pedido de medida cautelar da Fenaguardas, mantendo a decisão do TJ-SP. Em sua fundamentação, o ministro destacou que a Constituição Federal utiliza de forma deliberada e sistemática a nomenclatura “Guarda Municipal”, tanto no texto constitucional quanto na legislação infraconstitucional, como o Estatuto Geral das Guardas Municipais (Lei nº 13.022/2014) e a Lei que institui o Sistema Único de Segurança Pública (Lei nº 13.675/2018). Permitir que um município altere essa nomenclatura por meio de lei local criaria um precedente perigoso, podendo levar à modificação arbitrária de outras instituições constitucionalmente nomeadas. ? ?

      O ministro também ressaltou que a terminologia empregada pela Constituição não é meramente simbólica, pois assegura coerência e estabilidade ao ordenamento jurídico em um estado federal, no qual a autonomia dos entes subnacionais é limitada e não significa soberania. ?

      Portanto, a decisão do STF na ADPF 1214 reafirma que os municípios não podem, por meio de legislação local, alterar a denominação de suas guardas municipais para “Polícia Municipal”, pois isso contraria a nomenclatura estabelecida pela Constituição Federal e pelas leis federais que regulamentam a segurança pública.

      No entanto, é bom lembrar que essa decisão ainda será submetida a referendo do Plenário.

      Vale ressaltar que o artigo 22 do Estatuto das Guardas Municipais permite no máximo a manutenção de alguns nomes alternativos. Veja abaixo:

      “ Art. 22 – Lei nº 13.022 de 2014

      (…)

      Art. 22. Aplica-se esta Lei a todas as guardas municipais existentes na data de sua publicação, a cujas disposições devem adaptar-se no prazo de 2 (dois) anos.

      Parágrafo único. É assegurada a utilização de outras denominações consagradas pelo uso, como guarda civil, guarda civil municipal, guarda metropolitana e guarda civil metropolitana”

      Eu ia escrever um novo artigo falando da inconstitucionalidades da contratação de temporários sem concurso para serem “guardas municipais” da milícia do Paes, mas instigado por sua mensagem, escreverei também um outro artigo tratando da mudança do nome.

      Obrigado.

      Um abraço. Antônio Sá

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